Ultimamente tive a oportunidade de trabalhar com recursos
de multas de trânsito, e fiquei impressionado como os órgãos da Administração
Pública desrespeitam as normas relativas à imposição de multas de trânsito.
E mais, já não bastasse, persiste o descaso
relativo aos recursos administrativos das multas impostas, que se desenvolvem
ao total arrepio da legislação pertinente. Afinal, quem, dos que já tentaram
recorrer de uma multa, não tiveram como resposta do recurso um simples “indefiro
o recurso”, sem qualquer motivação sobre as razões do indeferimento?
Insta esclarecer que a Administração
Pública tem sua atuação vinculada às leis por seu dever de estrita obediência
ao princípio da legalidade, esculpido no artigo 37 da Constituição Federal e
nas demais legislações pertinentes ao tema.
Outrossim, este artigo se dedicará a
analisar o procedimento a ser adotado pela Administração Pública à imposição da
multa de trânsito e ao desenvolvimento do processo administrativo, com foco às
normas do Código de Trânsito Brasileiro, a Lei Estadual Paulista 10.177/1998, a
Constituição e demais sistemas jurídicos pertinentes.
Autuação
da Infração de Trânsito
Segundo o artigo 280 do Código de
Trânsito Brasileiro, ao ser verificada a ocorrência da infração prevista na
legislação de trânsito, a autoridade administrativa deverá lavrar o auto de
infração, com as seguintes informações: a) a tipificação da infração, ou seja,
a conduta legalmente descrita como infração de trânsito, com a menção ao
referido dispositivo legal; b) o local a data e a hora da ocorrência da
infração; c) a placa de identificação do veículo, a marca e espécie, bem como
os demais elementos que se julgue necessário a identificação do veículo; d) o
prontuário do condutor (quando possível); identificação do órgão ou entidade e
da autoridade ou agente autuador ou o equipamento que comprovar a infração; e)
quando possível, a assinatura do infrator, que vale como notificação do
cometimento da infração.
Quanto à prova da infração está é
feita mediante declaração da autoridade, ou agente da autoridade de trânsito,
aparelho eletrônico ou audiovisual, reações químicas, ou outro meio
tecnologicamente disponível, desde que devidamente regulamentado pelo CONTRAN.
Não sendo possível a autuação em flagrante, o agente de
trânsito relatará o fato à autoridade no próprio auto de infração, informando
os dados a respeito do veículo, além da tipificação da infração, o local, a
data e a hora, e a placa de identificação do veículo, marca e espécie.
Desta feita, o agente da autoridade de trânsito competente
para lavrar o auto de infração poderá ser servidor civil, estatutário ou
celetista ou, ainda, policial militar designado pela autoridade de trânsito com
jurisdição sobre a via no âmbito de sua competência.
Segundo o disposto no artigo 281 do citado diploma legal:
Art. 281. A autoridade de
trânsito, na esfera da competência estabelecida neste Código e dentro de
sua circunscrição, julgará a
consistência do auto de infração e aplicará a penalidade cabível.
Parágrafo único.
O auto de infração será arquivado e seu
registro julgado insubsistente:
I - se considerado inconsistente ou irregular;
(grifo nosso)
Cumpre ainda dizer que, segundo o artigo 12 do CTB, cabe ao
CONTRAN,
estabelecer e normatizar os
procedimentos para a imposição, a arrecadação e a compensação das multas por
infrações cometidas em unidade da Federação diferente da do licenciamento do
veículo.
Segundo o artigo 3º da Resolução 404, de 12 de Julho de
2012, expedida pelo CONTRAN – Conselho Nacional de Trânsito:
Art.
3º
À exceção do disposto no § 5º do artigo anterior, após a verificação da regularidade
e da consistência do Auto de Infração, a autoridade de trânsito
expedirá, no prazo máximo de 30 (trinta) dias contados da data do
cometimento da infração, a Notificação da Autuação dirigida ao proprietário do
veículo, na qual deverão constar os dados mínimos definidos no art. 280 do CTB
e em regulamentação específica.
§ 1º Quando utilizada a remessa
postal, a expedição se caracterizará pela entrega da notificação da autuação
pelo órgão ou entidade de trânsito à empresa responsável por seu envio.
§ 2º A não expedição da notificação da
autuação no prazo previsto no caput deste artigo ensejará o arquivamento do
Auto de Infração.
§ 3º Da Notificação da Autuação
constará a data do término do prazo para a apresentação da Defesa da Autuação
pelo proprietário do veículo ou pelo condutor infrator
devidamente identificado, que não
será inferior a 15 (quinze) dias, contados da data da notificação da autuação
ou publicação por edital, observado o disposto no art. 12 desta Resolução.
§ 4º A autoridade de trânsito
poderá socorrer-se de meios tecnológicos para verificação da regularidade e da
consistência do Auto de Infração.
§ 5º Os dados do condutor identificado
no Auto de Infração deverão constar na Notificação da Autuação, observada a
regulamentação específica.
(grifo nosso)
A
este ponto torna-se forçoso concluir, portanto, que é dever do agente público,
e direito do suposto infrator notificado, a observância aos requisitos do artigo 280 do CTB e do prazo
prescrito na resolução emitida pelo CONTRAN, órgão legalmente legitimado a
regular os procedimentos de imposição de multas por infrações cometidas.
No
mais, a inobservância, pelo agente administrativo, de qualquer dos requisitos
abordados, atenta ao próprio direito de defesa do suposto infrator, pois restringe
seus argumentos de defesa, seja pela falta de informações, seja pelo excessivo
lapso temporal que o impede de analisar pressupostos extrínsecos a sua defesa
administrativa, além de notoriamente impedir que seja precisado o real
infrator.
Mas
apesar de tudo isso, como relatado no início deste artigo, há casos em que a Administração
Pública não observa tais normas como deveria, gerando, além de extremos
aborrecimentos, a publicidade negativa de seus órgão, fazendo parecer tratar-se
de mais um instrumento de arrecadação ao erário, do que uma medida de proteção
social, voltada à punição pedagógica dos infratores de trânsito.
De
fato a multa por infração de trânsito tem papel social fundamental a consecução
dos fins correlatos as políticas públicas de trânsito, que visam mais
segurança, organização, o estímulo a cordialidade e a prudência necessária ao
bom funcionamento do sistema de trânsito. Porém, lamentavelmente, parece que
por vezes a administração pública desvirtua essa finalidade sócio-pedagógica em
um meio de arrecadação, atitude que atinge a própria moralidade da
administração pública, que já se encontra tão em baixa hodiernamente.
Outrossim, nos casos de ser surpreendido pela imposição de uma multa de trânsito que não observe esses requisitos essenciais a sua expedição, poderá o suposto infrator interpor recurso administrativo, que será tratado no próximo artigo.
*evite plágio, indique a fonte*
RODRIGUES, B.L.S., Multas de Trânsito I – Procedimento de Imposição de Multa e Processo Administrativo, visto em brunolsrodrigues@blogspot.com, acessado em ____________.
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